Brasil não assina documento da Cúpula do Clima para zerar desmatamento até 2030

Barrado. Urso Polar no meio dos manifestantes na Conferência do Clima, 
em Nova York - Timothy A. Clary / AFP

24/09/2014

Conferência em Nova York determina compromissos, mas ministra do Meio Ambiente diz que país ‘não foi convidado a participar’

Dono da maior floresta tropical do mundo, o Brasil surpreendeu a comunidade internacional e não assinou ontem um acordo de combate ao desmatamento apresentado durante a Cúpula do Clima, em Nova York, um encontro que reuniu mais de 120 chefes de Estado. O documento propõe reduzir pela metade o corte de florestas até 2020 e zerá-lo na década seguinte. Com esta medida, entre 4,5 bilhões e 8,8 bilhões de toneladas de CO2 deixariam de ser liberadas para a atmosfera — o equivalente à remoção de um bilhão de carros das ruas até 2030.

A Declaração de Nova York, como foi batizada foi elaborada por um grupo de países europeus e endossado por 32 Estados — entre eles EUA, Canadá, Noruega, Inglaterra e Indonésia —, além de empresas, entidades civis e comunidades indígenas. O documento segue aberto para adesões até dezembro de 2015, quando acontece a Conferência de Paris. A exemplo do Brasil, China e Índia, que também estão entre os maiores desmatadores do mundo, rejeitaram o documento.

Embora tenha considerado o acordo importante e criticado o Brasil por rejeitá-lo, o Greenpeace também não o assinou por considerá-lo vago demais. Segundo a ONG, os compromissos voluntários não substituem ações governamentais.

— Precisamos de leis fortes para proteger florestas e pessoas, assim como de uma melhor aplicação das leis existentes — explicou o diretor-executivo internacional do grupo, Kumi Naidoo. — Deter a perda global de florestas em 2030 no máximo significaria que anos de desmatamento ainda estariam à nossa frente.

De acordo com uma fonte próxima à negociação, a Missão Brasileira na ONU recebeu o texto há cerca de um mês e o enviou a Brasília, que teria apontado trechos incompatíveis com o novo Código Florestal:

— Entramos em contato com esse grupo de países por trás da iniciativa e pedimos algumas modificações no texto final, pois não podemos nos associar a uma declaração que vá de encontro a uma lei nossa. Ponderamos essa questão e pedimos que o texto fosse ajustado, mas eles disseram que não podiam, porque já estava fechado. E o Brasil obviamente não se associou.

A presidente Dilma Rousseff durante seu discurso na Cupula do Clima - Timothy A. Clary / AFP

Em entrevista a agências internacionais, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, afirmou que o texto do acordo pode colidir com a legislação brasileira.

— É diferente ter deflorestamento legal e deflorestamento ilegal. Nossa política nacional é combater o desmatamento ilegal — explicou.

O Brasil quer, por exemplo, debater os pontos do texto com outras nações florestais e ver se há compatibilidade entre a proposta europeia e tanto as negociações climáticas correntes quanto a política ambiental brasileira. O país também não quer perder as rédeas desta discussão, que compartilha com outros pares, pois, como descreveu um observador, “se tem uma coisa que em clima está dando certo é floresta, a queda de desmatamento”.

DECISÃO PODE SER ESTRATÉGICA

Diretor executivo da Agência de Investigação Ambiental (EIA, na sigla em inglês), Alexander Von Bismarck diz que na prática o país tem tido uma ação extremamente positiva, o que é mais importante do que assinar uma declaração:

— A questão é: o que acontece depois? Esses documentos são úteis e importantes, mas as florestas precisam de ação. O Brasil adotou medidas importantes para combater o desmatamento ilegal, mas aqui nos EUA as pessoas ainda estão comprando madeira extraída ilegalmente do Brasil.

Diretor do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, Osvaldo Stella avalia que a rejeição brasileira ao acordo pode ser “estratégica”.

— Talvez este não seja o melhor momento para assinar um documento — explica. — O desmatamento é uma importante fonte de emissões de CO2 do Brasil, mas irrelevante em outros grandes países. Então, o melhor, para nós, seria negociar simultaneamente todas as causas do aquecimento global. Desta forma, não perdemos peso nas conversas das próximas conferências.

O acordo novaiorquino propõe ainda a formação de um fundo global de combate ao desmatamento, no valor de pelo menos US$ 1 bilhão, destinado a países pobres que preservem as suas florestas. Também lembra que cerca de 500 milhões de pequenos fazendeiros, especialmente na África e no Sul da Ásia, estão vulneráveis a eventos extremos que afetariam a produção de alimentos, como a escassez de água e grandes tempestades.

O presidente dos EUA, Barack Obama, durante discurso na ONU - Saul Loeb / AFP

Grandes empresas também aderiram ao documento, entre elas petrolíferas, prometendo reduzir a emissão de gases-estufa na geração de energia.

A secretária-geral do WWF-Brasil, Maria Cecília Wey de Brito, acredita que as dificuldades em conseguir um engajamento total da iniciativa privada e dos governos contra as mudanças climáticas impediram que a cúpula obtivesse melhores resultados.

— Por enquanto, estamos apenas na linha das promessas. O duro é comprar uma briga contra o lobby do petróleo e conseguir uma economia de baixo carbono em todas as áreas. Este é um plano muito complexo — admite. — Este encontro foi importante, porque provocou uma mobilização no mundo inteiro e mostrou como a opinião pública e até os investidores estão preocupados. Mas só teremos um dia histórico quando um acordo amplo for assinado pelos governantes.

BRASIL ANUNCIA CONQUISTAS NA AMAZÔNIA

Em um discurso de quase oito minutos, a presidente Dilma Rousseff revelou que o desmatamento no Brasil diminuiu 79% em oito anos. Esta seria uma amostra de que o crescimento econômico não é incompatível com a adoção de medidas de preservação ambiental.

— O Brasil não anuncia promessas. Mostra resultados — ressaltou. — Ao mesmo tempo em que diminuímos a pobreza e a desigualdade social, protegemos o meio ambiente. Nos últimos 12 anos, temos tido resultados extraordinários.

Já o presidente americano, Barack Obama, usou seu discurso no evento para assumir a responsabilidade de seu governo e, também, pressionar a China a tomar atitudes. Segundo ele, os países têm que “deixar de lado nossas velhas diferenças”. Já o vice-premier chinês, Zhang Gaoli, revelou que o país teria como objetivo limitar as emissões ou atingir o seu pico “o mais cedo possível”. Alguns conselheiros de Pequim avaliam que isso só deve acontecer depois de 2030.

Durante a Cúpula, Coreia do Sul, Dinamarca e Suíça anunciaram a doação de cerca de US$ 270 milhões para o Fundo Verde para o Clima, criado em 2010 pela ONU. França e Alemanha prometeram doar US$ 1 bilhão “nos próximos anos”.

PREFEITOS FAZEM PACTO GLOBAL

Ao lado do secretário-geral da ONU, Ban ki-Moon, o prefeito Eduardo Paes, presidente do C40 — o grupo das 69 maiores cidades do mundo — anunciou o Pacto Global dos Prefeitos. Com o acordo, 228 cidades, que abrigam quase meio bilhão de pessoas, assumem o compromisso de reduzir a emissão de gases-estufa em até 13 milhões de toneladas até 2050.

Fonte: O Globo


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