Piauiense cata lixo reciclável para pagar curso de engenharia ambiental

13/07/2016

Arquivo Pessoal
De latinha em latinha, João do Lixo paga a faculdade. A paixão de cuidar do meio ambiente de forma profissional fez o catador de lixo João Francisco de Oliveira Nery, 35, largar o curso de fisioterapia e prestar vestibular para ingressar em engenharia ambiental e sanitária numa faculdade particular de Teresina (PI). É com a reciclagem de lixo que ele paga R$ 953 de mensalidade da faculdade e tira o sustento da família.

Nery conta que aprendeu a cuidar do meio ambiente e ao mesmo tempo fazer dinheiro para sustentar a família com material que iria para o lixo. Além da mensalidade da faculdade, ele paga o transporte e as demais despesas do curso, com material de estudo, além de comprar alimentos da casa e pagar as contas de água e energia elétrica. O aluguel é de responsabilidade da mulher, que trabalha em um banco. O casal tem um menino de um ano e seis meses.

"Eu me sinto responsável por passar a educação ambiental para que as pessoas façam o descarte do lixo correto. Sempre gostei de cuidar do meio ambiente, mas pensei que poderia estudar para me profissionalizar. Por isso, resolvi fazer o curso de engenharia ambiental e sanitária. É do meu trabalho com o lixo que pago a faculdade e me mantenho", explica Nery.

João do Lixo conta que desde criança foi atraído pelo reaproveitamento de objetos, sem sequer ainda ter noção de reciclagem. Ele gostava de catar latinhas de refrigerante na praia para brincar com os irmãos. Ainda criança, o primeiro dinheiro que ganhou foi desmontando uma televisão.

"Meu pai perdeu o emprego e foi obrigado consertar televisores para sustentar a família. Certa vez, pediu-me ajuda no trabalho, mas eu não tinha habilidade nos reparos. Então, ele pediu-me que desmontasse um aparelho de televisão e retirasse o cobre e o alumínio para vender na sucata. Eu fiz e apuramos dinheiro", conta o estudante, que passou anos desmontando televisores quebrados para retirar os metais e revendê-los.

Atualmente, o plástico de garrafas pet é o principal material reciclado da renda do catador de lixo. O quilo do plástico das garrafas pets é vendido ao preço de R$ 0,40 e o quilo de alumínio das latinhas de cerveja e refrigerantes custa R$ 1,50. "Apesar do quilo das latinhas ser mais caro, as pets me rendem mais pela quantidade que consigo recolher. As pessoas usam mais garrafas pelo volume maior do líquido a ser consumido", explica Nery. Parte do material reciclado vai para uma indústria de vassouras em Teresina e a outra é repassada para um atravessador, que destina o produto para Fortaleza (CE).

O catador de lixo não sabe precisar quanto ganha por mês com a reciclagem, pois chega a juntar dois a três meses de material no quintal da casa dele. No tempo de chuva, ele diminui a coleta e armazena em um quartinho cedido na casa dos pais.

"O dinheiro que eu apuro com as vendas pago as contas e guardo o que sobra para o mês seguinte porque nem todo mês dá para vender o material reciclado que juntei. Os atravessadores não vêm buscar material em pouca quantidade, tenho de juntar pelo menos 6 bags [sacos feitos com plástico reciclado] que dão 6 mil litros cada. Quando em determinado mês não consigo o dinheiro todo da mensalidade da faculdade, meus pais me ajudam e vou levando até concluir o curso", destaca.

Nery diz que é o único estudante do curso que trabalha como catador de lixo e que nem ele, nem a família, sentem vergonha do seu trabalho. A mulher dele ajuda no transporte do carrinho recolhe o material reciclado.

"Vou na mala aberta segurando o carrinho fora e ela vai dirigindo. As pessoas ficam rindo, mas não me envergonho do meu trabalho, que é justo e é dele que tenho acesso ao estudo. Quero me profissionalizar para montar minha empresa de limpeza de eventos e reciclagem de lixo para não depender de atravessadores, comprar as máquinas de prensagem", diz ele.

Jornada de trabalho

Nery trabalha durante o dia, de segunda a sexta-feira, pois cursa faculdade no período noturno. Já nos fins de semana, a jornada é intensa, pois ele aproveita as festas para recolher o material descartado com o consumo de refrigerantes e de cerveja. Ele passa a noite catando lixo e amanhece organizando o material para ser transportado para o quintal da casa dele. Durante a semana, o catador passa o dia organizando o material que recolheu, prensando as latinhas e colocando as garrafas pets nas sacolas. Uma vez por mês ou a cada dois meses, ele vende todo material, paga as contas e guarda o que sobrou para o mês seguinte.

"Eu tenho sete lixeiros grandes e espalho no local do evento, mas a falta de hábito das pessoas em jogar o lixo no local correto acaba que arrecado mais no chão do que o que colocam dentro das lixeiras. As pessoas precisam ainda de educação ambiental para se habituarem a descartar o lixo de forma correta. É incrível que como jogam mais latinhas ao redor das lixeiras do que dentro delas", ressalta o catador de lixo.

O catador de lixo conta que já ensina o filho a ter noções de reciclagem do lixo para que ele seja tenha cuidado com o meio ambiente. Para ele, as crianças são as "sementes" do futuro para cuidar do planeta. "Eu tomo conta dele enquanto minha mulher está no trabalho. Eu trabalho com ele aqui junto e ele já vai observando como é a separação e preparo do material reciclado. Posso juntar o lixo que for, mas ele vai estudar numa escola boa, vou pagar a escola para ele passar numa faculdade pública", diz.

Fonte: UOL

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